A trincheira de luta e resistĂȘncia dos trabalhadores estĂĄ Ă deriva
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A reforma trabalhista implementada no governo Temer e aprofundada no governo Bolsonaro fragilizou sensivelmente a organização dos trabalhadores atravĂ©s de suas trincheiras de lutas: os sindicatos. Contribuiu para tanto tambĂ©m a situação financeira dos sindicatos, que piorou com a Medida ProvisĂłria (MP) nÂș 873, que determinou novas regras para o recolhimento da contribuição sindical.
A ineficiĂȘncia do mercado de trabalho e das polĂticas pĂșblicas para os trabalhadores aumentou a informalidade e o desemprego. Alguns tĂ©cnicos e economicistas afirmam que o desemprego começou a cair apĂłs a reforma trabalhista. Entretanto, nĂŁo Ă© verdadeira essa tese, pois a informalidade aumentou porque aumentou o desemprego, que transferiu a mĂŁo de obra assalariada para o trabalho informal.
A Pesquisa Nacional por Amostra de DomicĂlio ContĂnua (PNAD ContĂnua), do IBGE, dos meses de junho a setembro de 209 joga tintas ainda mais dramĂĄticas sobre a precarização crescente do trabalho no Brasil. Pela PNAD ContĂnua, o Brasil tomou ciĂȘncia de que o trabalho informal bate todos os recordes e atinge 39,7 milhĂ”es de trabalhadores no perĂodo pesquisado. O trabalho informal Ă© constituĂdo de 11,5 milhĂ”es de trabalhadores do setor privado sem carteira assinada; 18,9 milhĂ”es de autĂŽnomos sem CNPJ; 4,5 milhĂ”es de trabalhadores domĂ©sticos sem carteira; 2,6 milhĂ”es de trabalhadores sem registro no setor pĂșblico e 2,2 milhĂ”es que auxiliam a famĂlia em trabalho informal.
A perversa reforma trabalhista tambĂ©m limitou o papel da Justiça do Trabalho, aplicando a tese de intervenção mĂnima da Justiça nos conflitos individuais e coletivos e intimidando os trabalhadores com a ameaça de pagamento de multas abusivas. Outra consequĂȘncia da informalidade estĂĄ no declĂnio vertiginoso da arrecadação de tributos relativos Ă folha de pagamento com relação Ă s contribuiçÔes previdenciĂĄrias.
Enquanto os trabalhadores vĂȘm sofrendo com o desemprego e a informalidade, suas entidades de classes (sindicatos) estĂŁo preocupadas com sua prĂłpria receita, apostando numa reforma sindical que propicie mecanismo de aumento de receita. Essas entidades estĂŁo articulando propostas dirigidas aos trabalhadores que nĂŁo pagam as contribuiçÔes sindical e assistencial de perderem direitos, tais como: reajuste salarial, vale-refeição, participação nos lucros, adicional noturno, etc.
Entretanto, uma das apostas Ă©, sem sombra de dĂșvidas, a Proposta de Emenda Ă Constituição (PEC) 196/19, da autoria do deputado Marcelo Ramos (PL-AM), que trata da reforma sindical e que tem propĂłsito de conferir nova redação ao artigo 8Âș da Constituição e altera o ADCT (Ato das DisposiçÔes Constitucionais TransitĂłrias), para promover âReforma no Sistema Sindicalâ com objetivo de "assegurar a liberdade sindical".
ApĂłs perderem atĂ© 80% da arrecadação com a reforma trabalhista, as centrais sindicais tambĂ©m articulam com o Congresso uma Proposta de Emenda Ă Constituição (PEC) que possibilite a reestruturação das entidades sindicais. Entre as propostas estĂĄ a adoção de taxa negocial pela qual sĂł os trabalhadores sindicalizados que aceitem pagar a taxa serĂŁo beneficiados pelas negociaçÔes salariais, o que Ă© pela legislação entĂŁo vigente Ă© ilegal,alĂ©m de imoral e inconseqĂŒente, pois divide ainda mais os trabalhadores.
Em sĂntese, a proposta, se aprovada, darĂĄ nova redação ao artigo 8Âș da Constituição e estabelece que âĂ© assegurada a liberdade sindicalâ, de modo que o Estado nĂŁo poderĂĄ exigir autorização para fundação de entidade sindical, mas manterĂĄ a prerrogativa de efetuar o registro dos atos constitutivos no Registro Civil de Pessoas JurĂdicas.
Os defensores dessa PEC, afirmam que "a proposta estabelece que a organização de trabalhadores e empregadores serĂĄ definida por setor econĂŽmico ou ramo de atividade, sendo que a base territorial do sindicato serĂĄ definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, nĂŁo podendo ser inferior a ĂĄrea de um municĂpioâ. Ao impedir que a base territorial nĂŁo possa ser inferior a ĂĄrea de um municĂpio, o texto veda a possibilidade de criação de sindicato por empresa.
A nova proposta assegura que a entidade sindical possa pleitear, por meio de plebiscito ou consulta estruturada, a exclusividade de representação por perĂodo a ser definido pelo Conselho Nacional de Organização Sindical (CNOS). Na verdade, o objetivo da PEC/196 Ă© acabar com a unicidade sindical e instituir mecanismo para criação de sindicatos por empresa.
Segundo informativo sindical, "a CUT controla 2.319 sindicatos, a Força Sindical e a UGT controlam, respectivamente, 1.615 e 1.277 sindicatosâ. Entretanto, estĂŁo apoiando a PEC/196, com algumas restriçÔes, numa clara intenção de obter privilĂ©gios concedidos pelo Estado o que tem muito pouco a ver com a defesa dos trabalhadores. Prova disso Ă© que milhares de trabalhadores estĂŁo perdendo seus empregos e nĂŁo hĂĄ nenhuma resistĂȘncia por parte das entidades sindicais.
Ă preciso que as federaçÔes, confederaçÔes e centrais sindicais deixem de lado suas divergĂȘncias polĂticas e ideolĂłgicas e se unam numa grande frente de mobilização dos trabalhadores em defesa do emprego e das liberdades sindicais. SĂł assim serĂĄ possĂvel barrar o perverso ataque das polĂticas governamentais de retirada de direitos individuais e coletivos.
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Dr. Carlos Augusto Martins Aguiar